Pouco se fala do papel do oriente na gênese do Movimento Moderno na Arquitetura. A visão tende a ser européia quando o assunto vai de encontro com os primeiros pensamentos de vanguarda. Se alguns vão um pouco mais longe ao afirmar que o Modernismo começou com o Suprematismo de Malevich e o Construtivismo de Tatlin (inspirados pelas desconcertantes pinturas de Picasso), uma minoria discute a provável influência da cultura japonesa na arquitetura de Frank Lloyd Wright.
Muitos se esquecem que, no final do século XIX / início do século XX, Wright já experimentava com uma arquitetura proto-moderna, caucada em conceitos de constante evolução e prática.
Antes que Corbusier, Mies ou Gropius desenvolvessem as teorias que definiriam a profissão nos anos futuros, o arquiteto norte-americano se deixava inspirar pelo pavilhão japonês Ho-o-den na World's Columbian Exposition, realizada na cidade de Chicago, em 1895.
O pavilhão Ho-o-den do Japão, contrastando com a arquitetura eclética da época.
Mesmo a evidência histórica que viria a moldar a Arquitetura Moderna no Brasil é cheia de furos e omissões importantes nesse sentido.
A evidência, é claro, foi a vinda de Corbusier a nosso país, que resultou no edifício do Ministério da Saúde e Educação, atual Palácio Gustavo Capanema.
Pouco é divulgado, porém, que anos antes de projetar o edifício no mesmo Rio de Janeiro (capital federal à época, importante lembrar), Lucio Costa receberia ao lado de Gregori Warchavchik ninguém menos do que Frank Lloyd Wright!
Como bem documenta o livro de Adriana Irigoyen, "Wright e Artigas: Duas Viagens" (Ateliê Editorial), o arquiteto norte-americano teve papel importante na mudança de nossa formação, ajudando a disseminar as idéias modernistas em meio a uma profissão e quadro acadêmico ainda extremamente ligado às Belas Artes.
A arquitetura tradicional japonesa, em certo argumento radical e generalista, poderia ser considerada a primeira arquitetura proto-moderna da história. Suas formas puras, leveza e verdade do material foram amplamente inspiradoras para diversos artistas e arquitetos no século XIX (Vincent van Gogh era fascinado pela arte nipônica). Todos os conceitos orgânicos dessa arquitetura foram estudados por Frank Lloyd Wright, manifestando-se, ainda que de forma autoral, em suas obras, que tiveram mais divulgação do que se imagina para as vanguardas européias.
Robie House (1906-9) - Frank Lloyd Wright
Portanto é inegável a influência que a arquitetura tradicional do país do sol nascente teve no século XX. Mas o que separa essa arquitetura tradicional da arquitetura contemporânea japonesa?
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Aparente fruto da remodelação do Japão após a Segunda Guerra Mundial, o Metabolismo foi uma tentativa de criar, mesmo que por meios fantásticos ou utópicos, uma arquitetura capaz de suprir as enormes questões de infraestrutura urbana em tão pequeno território. Através da racionalização e da tecnologia, uma geração de arquitetos vanguardistas foi responsável por uma rica produção.
Em seu recente livro "Project Japan", o arquiteto holandês Rem Koolhaas entrevista os protagonistas e narra os acontecimentos desse período da história nipônica. Com a ajuda de Hans Ulrich Obrist (com quem esteve em São Paulo recentemente), Koolhaas recolhe relatos até então desconhecidos desse movimento, como por exemplo, o fato de muitos arquitetos terem definido seus conceitos sobre urbanismo de professores que projetaram cidades na invasão do Japão à China na década de 1930.
O livro Project Japan: Metabolism Talks
Para começar a entender o que foi o Metabolismo, talvez seja importante conhecer uma de suas mais simbólicas obras: A Torre Cápsula.
O edifício projetado por Kisho Kurokawa no ano de 1972 é, em muitos sentidos, a materialização dos pensamentos de uma época.
Um dos primeiros prédios a apresentar uma arquitetura "high tech", as duas torres possuem uma mesma base em comum e abrigam diversas cápsulas. Estas poderiam ser substituídas e destacadas de acordo com a necessidade.
Como a maioria das obras experimentais e que estreiam novos conceitos (tal como o edifício da Bauhaus ou a Villa Savoye), a técnica construtiva e tecnologia dos materiais não acompanharam à risca as idéias, dadas as dificuldades inerentes à época.
Embora a solução estrutural fosse completamente possível, a construção e manutenção das cápsulas as tornaram muito caras, acabando por arruinar a aparente "sustentabilidade" do edifício.
A Nakagin, empresa responsável pela manutenção do ícone da área central de Tóquio, entrou em falência, e foi vendida a uma empresa norte-americana. Interessada no terreno extremamente valorizado em que a Torre Cápsula está, a empresa deliberadamente deixou o prédio sem qualquer manutenção.
A consequência foi a deterioração da Torre. Kisho Kurokawa passou os últimos anos de sua vida lutando pela sobre-vida de um de seus mais emblemáticos projetos, propondo a substituição das cápsulas e sua manutenção. O arquiteto faleceu em 2007. Atualmente, o edifício infelizmente aguarda ser demolido.
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Continua...
Imagens e mais informações:
> Fotos do Pavilhão Japonês Ho-o-den: http://www.bc.edu/bc_org/avp/cas/fnart/fa267/1893fair.html
> Foto da Robie House: http://cchenut.wordpress.com/2010/01/04/lecture-03-art-nouveauvienne-chicago-oak-park-vienna-adolf-loos/robie-house/
> Foto da House N, de Sou Fujimoto, usada em comparação à ilustração do Ho-o-den: http://www.yankodesign.com/2008/10/20/nesting-doll-house/
> Mais informações e fotos do livro Project Japan: http://www.metalocus.es/content/es/blog/project-japan-metabolism-talks%E2%80%A6
> Fotos da Torre Capsula: http://www.archdaily.com/110745/ad-classics-nakagin-capsule-tower-kisho-kurokawa/ e http://awil-um.blogspot.com/2011/03/nakagin-capsule-tower.html
> IRIGOYEN, Adriana. Wright e Artigas: duas viagens. São Paulo, Ateliê Editorial, 2002.
Para mais informações sobre a Torre Cápsula de Tóquio, indicamos esse blog feito por estudantes, e a análise do ArchDaily Brasil:
Que matéria interessante! Eu sou fascinado pela arquitetura nipônica e é curioso saber que Wrigth provavelmente teve influências deles. Obrigado por ter postado os links!
ResponderExcluirQue bom que gostou Matheus. A influência japonesa na arquitetura de Frank Lloyd Wright é assunto dos mais interessantes. Fique ligado, pois pretendemos tornar Metabolismo Japonês uma longa série de postagens. Em breve colocaremos a parte 2 no ar. Obrigado pelo comentário.
ResponderExcluirVlw Dupla! Sempre ajudando meu TFG...:) Esse livro deve estar pra chegar aki em casa:)YEAH!
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